quinta-feira, 29 de novembro de 2012
Que limite para a dignidade humana?
Leiam este texto do Cardeal Odilo Scherer
«Qual é o preço da dignidade humana?»
«Eu teria preferido escrever sobre outro assunto nesta semana, mas o leilão da virgindade de uma jovem brasileira,
amplamente divulgado pela imprensa, requer uma reflexão. É um facto chocante e, ao mesmo tempo, parece tão banal que,
talvez, só chamou a atenção porque o leilão aconteceu de maneira aberta, pela internet, e porque o valor da licitação
foi alto. (...)
Afinal, o que está acontecendo? Pessoas colocam livremente a própria dignidade em leilão em troca de dinheiro?
O facto foi acompanhado com curiosidade mórbida e até com claque, para ver até onde a oferta chegaria. Chocar, por quê?
Nas calçadas de certas ruas da cidade e em tantas “casas do amor”, não acontece o mesmo todos os dias, sem que isso
chame a atenção, ou cause consternação em ninguém? Há mesmo quem quer legalizar a prostituição, como se fosse uma profissão qualquer.
Tudo se resolve no nível económico, também traficar pessoas, reduzi-las a escravas, vender bebés, comercializar órgãos humanos...
E há quem compre ou venda votos nas eleições, comprando ou vendendo a própria dignidade; e também quem suborne a justiça,
pondo em liquidação a própria consciência; há quem compre armas, use contra os outros, faça violência, mate, tudo pela vantagem económica.
E há quem trafica drogas, lucrando com o comércio da morte; e quem, simplesmente,
vai roubando o que é dos outros ou de todos: tudo pela vantagem económica que está em jogo...
Grande novidade nisso tudo não há; coisas que sempre aconteceram. O novo é que, sem nos darmos conta,
estamos a assimilar uma cultura do mercado, na qual o fator económico passou a ser o referencial maior:
e uma cultura de valores éticos e morais, para uma cultura do valor económico; o bem maior parece ser a vantagem económica,
que tudo permite e legítima, amolecendo qualquer resistência do senso moral.
Tudo fica justificado se há vantagem económica. Onde vamos parar?
Está mais do que na hora de colocar tudo isso em discussão novamente; será que essa tendência cultural
vai levar a um aprimoramento das relações humanas? A uma dignidade maior no convívio social? A uma valorização real das pessoas,
ao respeito pela justiça e a paz? Provavelmente não. Certamente não.
O ser humano, avaliado sobretudo na ótica da razão económica, deixa de ser pessoa e torna-se objeto quantificável.
Nisso também não há grande novidade; no passado houve a exploração dos escravos, dos operários, das mulheres.
Mas, sob protesto. O preocupante, agora, é que essa maneira de ver e fazer, passe por aceitável e normal e a própria pessoa
“objetivava”, outrora considerada vítima, agora seja vista como um sujeito autónomo e livre, que faz o que quer,
também com a sua própria dignidade; e tudo vai bem assim...
Voltaremos às feiras em que se vendem escravos? Livremente expostos à venda, aliás, ao leilão? O leilão da virgindade, por internet,
é um facto que deve preocupar educadores, juristas, filósofos... Da curiosidade mórbida, é preciso passar à reflexão, talvez com um pouco
mais de vergonha diante do que está acontecendo.
Nossa dignidade comum está sendo leiloada! É deprimente!»
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo, Brasil
23.11.2012
In Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
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